quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Rogers Waters revela seus traumas de garoto


Apesar da capa da revista, que trouxe os integrantes da “emblemática” banda Fresno, não ajudasse, a edição da Rolling Stone e dezembro pode ser considerada excelente. A revista trouxe uma matéria muito bem explorada sobre o nazismo no Brasil, mostrando imagens e depoimentos frutos da mais graduada pesquisa jornalística, o que revela que uma revista de entretenimento pode ir mais longe quando o assunto é jornalismo.

Mas a questão é que poucos comprar uma revista como a RS por causa dessas matérias. O que mais chama a atenção é a música. E nesse quesito a RS abordou temas atuais. A pedido da revista vários grandes nomes da rock internacional escreveram sobre John Lennon, entre eles Mick Jagger (Rolling Stones) e Pete Townshend (The Who). Vale muito a pena conferir, pois são depoimentos reveladores...

Para falar de Vida, livro biográfico recém- lançado de Keith Richards, a RS o entrevistou e produziu uma pequena mas curiosa matéria, onde foi possível extrair a seguinte frase de Richards.
“Quando me drogava, estava totalmente convencido de que meu corpo é meu templo, posso fazer o que quiser com ele e ninguém pode me dizer sim ou não.”

Mas onde a revista mais ganha pontos é na matéria com Roger Waters (ex-Pink Floyd?). A matéria vai direto ao coração do idealizador de The Wall e desvenda todos os monstros internalizados na cabeça do baixista mais famoso do rock progressivo. The Wall foi fruto dos traumas e das aflições de um garoto perturbado pela II Guerra e mais ainda pela morte do pai. Esta foi a essência da matéria. Não precisa ser nenhum mestre no assunto para se chegar a essa conclusão, mas ditas pelas palavras de Waters o conteúdo ganha outra dimensão. Vale à pena conferir tudo.

Para terminar. O ensaio fotográfico com David Jones é imperdível!

Leia a seguir, trecho da matéria: Reerguendo o Muro



Roger Waters está pronto para começar uma turnê na qual um muro de 11 metros de altura será erguido - todas as noites! - entre ele e seus fãs. E, neste momento, ninguém iria condená- lo se ele desejasse que a coisa fosse um pouco mais portátil. O ex-líder do Pink Floyd acaba de acomodar seu corpo magro de mais de 1,90 metro de altura em um carro alugado em Manhattan, Nova York, para ir até um restaurante em Midtown, e imediatamente fica claro que o motorista está emocionadíssimo por vê-lo. Waters se prepara. "Fui seu fã a vida inteira, cara", diz o motorista, um sujeito de meia-idade chamado Fred, com sotaque nova-iorquino bem carregado. "'Wish You Were Here' - eu estava viajando de mochila pela Europa quando me liguei nesse som. Fiquei, tipo: 'Este é o melhor disco de todos os tempos!'. Deve ser uma sensação incrível saber o impacto que você teve sobre a minha geração."

"Normalmente, ninguém sabe até o momento em que entra no carro [de alguém dessa geração]", Waters responde em seu tom britânico ríspido e afivela o cinto de segurança. Como sempre, é difícil ler seus olhos azuis gelados - que hoje combinam com o tom de cabelo grisalho, levemente comprido, e a barba professoral. Mas parece que ele está brincando. O fato de ele ter acabado de compartilhar uma garrafa excelente de Montrachet para comemorar o fim de um longo dia de trabalho deve ter ajudado. Depois de vir de carro para Nova York pela manhã, ele foi submetido a exercícios puxados para os bíceps, os tríceps e o abdome ("Quase me mata, mas preciso ficar um pouco mais forte"), cantou escalas com uma professora de voz que o está ajudando a recuperar as notas altas da juventude, fez reunião com um produtor para escolher as roupas de palco pretos (rejeitou um par de botas de couro porque era "muito Bruce [Springsteen]" e outro por ser "Pete Townshend demais") e passou horas em um estúdio, fazendo ajustes à iluminação e à animação digital.

Ele está trabalhando nesse ritmo desde janeiro, determinado a aperfeiçoar a primeira e verdadeira versão em forma de turnê daquela que ele considera como a obra que definiu sua carreira, The Wall - álbum de 1979 que vendeu 30 milhões de cópias e que conta a história de um alienado astro do rock chamado Pink (cuja biografia traz muitas semelhanças com a sua própria). O show original do Pink Floyd - com seus bonecos gigantes, gráficos sincronizados e aquele muro, construído tijolo por tijolo e depois derrubado no clímax do show - estabeleceu parâmetros para todos os espetáculos de rock que vieram depois, de Steel Wheels (Rolling Stones) a Zoo TV (U2). Mas só foi encenado em quatro cidades do mundo, com meses de intervalo entre cada bloco de apresentações. Não foi lançado nenhum filme das performances, então elas se transformaram em uma lenda da qual as pessoas só guardam uma vaga lembrança - tirando a animação surreal de Gerald Scarfe, que também aparece na versão cinematográfica da obra, uma versão roteirizada e lançada em 1982.

Todos os shows deram prejuízo - os ingressos custavam cerca de US$ 12 - e a banda estava desmoronando. "Eles estavam chegando ao ponto em que um não suportava mais olhar para a cara do outro", diz Mark Fisher, o arquiteto que construiu tanto a versão de 1980 quanto a de 2010 da turnê (e que também trabalhou no palco "a garra" da turnê 360° do U2). "Foi muito conveniente eles poderem declarar que a coisa toda era um abacaxi, que era cara demais e cair fora com essas desculpas." O diretor de iluminação, Marc Brickman, que também trabalha no show novo, foi chamado para o projeto logo antes do início das apresentações originais. "Era alucinante - eu fiquei sem palavras", diz Brickman. "Era como montar uma ópera dentro de um show de rock and roll. Em 1980, não dava nem para sonhar com aquele show." Para Waters, a ideia por trás da teatralidade de arena era simples: "Não dá para pedir às pessoas irem ao circo e só colocar pulgas no meio do picadeiro - é preciso exibir elefantes e tigres."

Com seu alcance e ambição explícitos, The Wall foi o último baluarte daquilo que as bandas do punk e da new wave chamariam de "rock de dinossauro da década de 70" - mas a turnê que está para começar é muito mais do que uma reencenação em estilo "Parque dos Dinossauros". Waters trouxe o show para a atualidade com mensagens políticas bem audíveis: antiguerra, antiopressão. A letra de "Mother", por exemplo, não mudou - mas o vídeo que a acompanha, com suas imagens de uma câmera de segurança que tudo vê, agora fala de um governo opressivo, e não de uma mãe superprotetora. "É basicamente o mesmo show, mas com significado mais amplo", diz Fisher. "Precisamos encarar o fato de que é uma coisa um sujeito na casa dos 30 anos cantar sobre o início de sua vida adulta, que naquele momento era uma espécie de eco da criação que ele teve. Mas é outra coisa continuar fazendo isso quando se chega à casa dos 60."

O show se beneficia de 30 anos de avanços tecnológicos, sendo que os mais notáveis estão no vídeo de ultra-alta definição projetado no muro durante todo o espetáculo. Waters diz sentir o peso da idade, e está bem certo de que está será sua última grande turnê. "É uma empreitada enorme, e eu não tinha certeza se seria capaz de fazer isto", ele diz, sem soar muito convincente: ele parece certo de que é capaz, sim. Enquanto o carro avança na direção norte, Fred abre o celular e começa a ler em voz alta mensagens de texto das filhas, até sugerirmos que ele espere até parar em um sinal vermelho para fazer isso ("Eu costumo dar bronca nos motoristas que ficam mandando mensagem de texto", Waters diz em tom suave). Acontece que uma das filhas de Fred tinha escutando The Wall na academia, naquele dia mesmo. "Obrigado por doutriná-las", diz Waters, que está começando a se sentir lisonjeado. "Veja bem: eles precisam de educação! Porra, eu estava completamente errado." [Alusão à frase mais célebre da música "Another Brick in The Wall (Part II) ": "They don't need no education"; eles não precisam de educação] Fred está mais que deliciado. "Eles não precisam de controle dos pensamentos, cara!". [Mais uma alusão: "They don't need thought control", no original] Ele faz uma pausa, e depois perde o pudor: "Como é mesmo o verso seguinte? 'Nada de sa...' Qual é a palavra? 'Sarcasmo'", Waters responde.

Você confere mais fotos e lê esta matéria na íntegra na edição 51, dezembro/2010

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